Durante muito tempo o Linux foi visto como um sistema operacional mais voltado para o trabalho e não tão otimizado para jogos. Essa situação, entretanto, mudou bastante nos últimos anos com o surgimento de novos softwares e o sistema do pinguim marca presença até mesmo no Steam Deck, o PC portátil da Valve voltado para jogos.

Com essa evolução vista nos últimos anos, eu resolvi fazer alguns testes durante pouco mais de uma semana para contar como tem sido a experiência de jogar com o Linux e quais motivos deixaram o Linux mais fácil de ser utilizado para isso. Confira!

A escolha da distribuição Linux

Desde que comecei a usar Linux para algumas tarefas específicas, isso por volta de 2010, eu sempre optei pelo Ubuntu e distribuições baseadas no mesmo, como a Linux Mint. Dessa vez, entretanto, estava atrás de uma tarefa mais específica, jogar, e acabei fazendo optando por outra distribuição.

No caso, a minha escolha foi pela distribuição Manjaro, que é baseada no Arch, uma outra distribuição que nunca havia me parecido muito amigável. Os motivos que me levaram a escolher o Manjaro foram vídeos que vi a respeito de sua usabilidade, opções de ambientes gráficos e mais alguns pontos específicos.

Manjaro Linux

Imagem: reprodução/TecMasters

O Manjaro permite fazer o download da Steam praticamente com dois cliques e também permite fazer o download dos drivers proprietários da Nvidia de forma fácil, o que em tese garante um desempenho melhor para os usuários desta placa em comparação com o driver de código aberto. Outras distribuições, é claro, também permitem instalar o driver proprietário da Nvidia, enquanto usuários da AMD tendem a ter uma performance ainda melhor por conta de drivers open-source e outros motivos.

Steam no Linux (2)

Imagem: reprodução/TecMasters

Além do driver e da Steam, o Manjaro já vem com o suporte praticamente pronto, basta habilitar uma opção, para usar pacotes Flatpak e fazer a instalação de softwares do repositório AUR. Isso, para jogar, é opcional, mas ajuda a obter algumas ferramentas mais específicas que comento adiante.

Em relação à instalação do Manjaro Linux, devo admitir que fiquei surpreso com a rapidez e facilidade do processo. Além de ter reconhecido todos os meus hardwares e periféricos, até mesmo a instalação do driver proprietário da placa de vídeo, uma RTX 2070 Super, foi feita durante a instalação do sistema, ou seja, não precisei instalar o Manjaro e, depois, perder tempo instalando o tal driver proprietário da Nvidia.

Steam facilita até rodar jogos do Windows

A Steam é a maior loja digital de jogos para PC, sendo que praticamente todos os títulos presentes na mesma possuem versões para o Windows. Por sua vez, o sistema do pinguim até viu a quantidade de títulos nativos aumentar nos últimos anos, mas isso não ocorreu, pelo menos até agora, com a maioria dos lançamentos grandes.

Apesar desse detalhe até parecer um contra, e é em certos pontos, a verdade é que rodar os títulos do Windows no Linux é praticamente tão fácil quanto baixar um jogo nativo. Para que isso seja possível, nas configurações da Steam, basta ativar os recursos do “Steam Play”, que fazem o uso do Proton, um software responsável por traduzir instruções do Windows para serem executadas no sistema do pinguim.

Steam - ativando proton

Imagem: reprodução/TecMasters

Como mostra a imagem abaixo, em meu caso, eu testei o título Gunfire Reborn, que não possui versão para Linux. O seu download foi feito exclusivamente através da Steam, sendo que apenas um pequeno processo referente ao Vulkan é iniciado antes do título poder ser jogado para que certas configurações sejam realizadas de forma automática.

Gunfire Reborn sendo baixado na Steam

Imagem: reprodução/TecMasters

Em relação ao desempenho do Gunfire Reborn, não tenho nada a reclamar. Eu pude executar o título com as suas configurações gráficas no nível Alto e na resolução 4K com a taxa praticamente cravada em 60 FPS, de acordo com o contador de taxa de quadros por segundo do próprio título.

Gunfire Reborn rodando no Linux

Imagem: reprodução/TecMasters

Já um título mais popular, recente e pesado, o Resident Evil Village, também rodou sem nenhum tipo de problema. Inclusive, algo importante até a ser ressaltado, é que opções como o FSR puderam ser habilitadas para melhorar sua performance.

Resident Evil Village rodando no Linux

Imagem: reprodução/TecMasters

Em meus testes, não precisei mudar configurações, mas é imprescindível lembrar da existência do site Protondb. Através do mesmo, jogadores do Linux e usuários do Steam Deck compartilham configurações que foram usadas para rodar títulos através da plataforma da Valve.

Lutris é uma mãe

Se através da Valve, o usuário já tem acesso a muitos jogos, o Lutris é um dos softwares indispensáveis para quem vai usar o Linux para jogar. De forma geral, o aplicativo permite que você faça a instalação de jogos encontrados na Valve, Origin, GOG e outras lojas com configurações otimizadas para que os títulos rodem sem a necessidade de configurações extras.

Não apenas isso, o Lutris permite até mesmo que você instale jogos de outras fontes, como títulos não encontrados nas lojas mencionadas acima. Inclusive, graças ao Lutris, eu pude instalar a minha versão do primeiro Tropico, um jogo bem antigo, em português e rodá-lo sem bugs, algo impossível no Windows 10 e 11 (não estou me referindo a versão da GOG, que vem em inglês e sem o bug).

Lutris - Linux

Imagem: reprodução/TecMasters

O League of Legends, por exemplo, teve o seu download bem facilitado. No Lutris, basicamente, apenas fiz a busca pelo seu nome e segui as instruções para instalá-lo. Dentro de jogo, inclusive, posso falar que não presenciei nenhum bug e a performance também foi boa.

Outro título que instalei pelo Lutris foi o Need for Speed Heat, que teve um processo um pouco diferente. Nesse caso, primeiro tive que instalar o EA App, uma vez que possuo o jogo apenas na Origin, e fazer o seu download pelo aplicativo.

Need for Speed Heat no EA App

Imagem: reprodução/TecMasters

Em relação ao desempenho, a performance que obtive no Linux foi praticamente a mesma vista no Windows, mas não foi assim desde o começo. Eu li que alguns jogos da EA tendem a ter alguns stutterings no Linux, algo provavelmente relacionados a DRM ou seu client. Felizmente, após algumas horas jogando, a performance do título normalizou, o que me faz acreditar que o problema também pode ter relação com o cache shader do jogo ou algo similar.

Need for Speed Heat rodando no Linux

Imagem: reprodução/TecMasters

Apesar de ressaltar sobre não precisar de configurações extras para a maioria das situações, é importante lembrar que o Lutris também permite que ajustes manuais sejam feitos. Assim, caso algum jogo não rode bem com uma versão do Wine, o jogador pode trocar esta versão sem ter muito trabalho, já que tudo é realizado através de sua interface gráfica e não envolve, por exemplo, a reinstalação do título ou comandos no terminal.

Epic Games também tem sua vez no Linux

A Epic Games ainda não possui um client oficial para rodar no Linux, mas a comunidade criou uma solução bem interessante. O Heroic Games Launcher é um aplicativo de código aberto, que permite acessar tanto a Epic Games quanto a GOG. Apenas um adendo, o Lutris também traz o suporte a Epic Games, mas optei por usar o Heroic Games Launcher para este caso.

A sua interface, além de ser elegante, possui uma fácil utilização e traz todos os títulos que estão em sua conta com miniaturas prontos para serem baixados. Assim, de forma resumida, você loga na Epic Games e GOG e começa a fazer os downloads.

Heroic Games Launcher no Linux

Imagem: reprodução/TecMasters

De forma parecida com o que é visto no Lutris, para que os jogos funcionem, é necessário fazer um download do Wine ou Proton. Para os meus testes, a escolha foi o jogo Gloomhaven, que foi recentemente distribuído de graça e traz um sistema de combate que me agrada.

Gloomhaven no Linux

Imagem: reprodução/TecMasters

Já ao fazer o download do Proton pelo Heroic Games Launcher, o Gloomhaven rodou praticamente perfeito, mas o loading inicial na primeira execução, por algum motivo, foi mais devagar do que o devido. Por sua vez, em relação a performance já no jogo, nada a reclamar, uma vez que foi a mesma que tive no Windows.

Emulação feita com qualidade

Eu sempre fui um grande fã da emulação de consoles devido a melhoria proporcionada pelos emuladores e sua facilidade, já que ligar os consoles originais às vezes pode levar um bom tempo e dar trabalho. Por sua vez, o Linux chega até mesmo a ser melhor do que o Windows aqui em alguns quesitos.

Para começar, ao menos na loja do Manjaro, você consegue encontrar o Dolphin, PCSX2, RPCS3 e até o Retroarch. Alguns deles, é verdade, dependem de algumas configurações para funcionar, assim como no Windows, mas podem ser baixados de uma forma bem simples.

Dolphin na loja do Manjaro Linux

Imagem: reprodução/TecMasters

Eu foquei os meus testes em títulos do PlayStation 2 e GameCube. De forma geral, após fazer as configurações desejadas para ter melhorias gráficas, eu pude rodar os títulos na resolução 1440p sem qualquer tipo de lentidão.

Emulação do PlayStation 2 no Linux

Imagem: reprodução/TecMasters

Já para deixar tudo mais bonitinho, eu ainda fiz a instalação do EmulationStation Desktop Edition, uma interface gráfica que pode organizar os jogos com capas, descrições e outras informações relevantes.

Outras ferramentas úteis

Além da parte de jogos, é claro, existem algumas ferramentas úteis que podem ajudar a usar periféricos gamers no Linux. Uma das que mais gostei em meus testes foi o Mangohud, que é similar ao MSI Afterburner e ajuda a monitorar o desempenho de jogos.

A sua instalação pode ser feita de forma bem simples seguindo as instruções no Github ou, no caso do manjaro, pela sua própria loja.

Algo que senti a falta no Linux, mas que não é culpa do sistema, é a falta de softwares feitos pelas próprias fabricantes para controlar seus periféricos. Felizmente, a comunidade do sistema tem soluções interessantes para resolver essas questões, como o programa Piper, que me permitiu alterar o DPI do mouse G502 e outras configurações.

Piper - mudando DPI do mouse

Imagem: reprodução/TecMasters

Já ao usar o DualSense, eu tive um mesmo problema visto no Windows em que alguns jogos (fora da Steam) não oferecem suporte nativo ao controle do PlayStation 5. Para solucionar essa questão, eu baixei um aplicativo chamado ds360, que emula um controle do Xbox 360. A ferramenta resolveu meu maior problema que era o do controle não funcionar em certos jogos, mas a função de vibrar não funcionou.

Nem todos os jogos ainda funcionam no Linux

Apesar de todos os elogios feitos acima e mostrar que o Linux está cada vez mais pronto para jogos, a verdade é que alguns títulos ainda não rodam no sistema. A maioria destes, entretanto, são do tipo online e existe uma razão por trás.

Jogos como Valorant, Fortnite e Destiny 2 tem o seu foco em modos online e possuem versões nativas apenas para o Windows. Para evitar que jogadores usem cheats, os títulos contam com ferramentas mais invasivas que monitoram alguns aspectos do PC e seu sistema.

Por isso, quando o jogo está sendo rodado em um ambiente similar ao Windows, mas que não é o sistema da Microsoft, essas ferramentas impedem a sua execução. Alguns projetos para contornar estes problemas até surgiram recentemente em fase de desenvolvimento, mas a verdade é que, até este momento, ainda existem alguns títulos que não rodam no Linux, o que espero que mude em breve.

Conclusão

O Linux já havia feito avanços em relação aos jogos nos últimos anos e me surpreendeu mais uma vez. A maioria dos jogos podem ser instalados e jogados sem depender de grandes configurações, principalmente quando os mesmos estão na Steam.

Já quando um problema surge, o que está cada vez mais raro, a sua solução costuma envolver algum processo simples. Geralmente, tudo é solucionado através da interface gráfica dos próprios aplicativos, o que afasta cada vez mais aquela visão de comandos complexos. Não apenas isso, sites como o Protondb ajudam a obter mais informações.

Então, de forma geral, o saldo atual do Linux para jogos é positivo, uma vez que o sistema pode ser utilizado para jogar os principais títulos do momento com uma boa performance sem muito trabalho. Alguns jogos online, é verdade, ainda não rodam, mas quem sabe uma solução não surja em breve ou até mesmo versões nativas destes títulos.

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