A franquia Romancing SaGa, da Square Enix, sempre viveu em uma espécie de “limbo” do gênero dos jogos de RPG: por um lado, ela traz horas e horas de narrativa bem cadenciada e uma jogabilidade ímpar. Por outro, a marca é uma das mais densas e, consequentemente, acaba por afastar jogadores que estão entrando, mas ainda não são totalmente imersos neste tipo de game.

Minstrel Song Remastered, o mais recente lançamento da franquia, é possivelmente o mais próximo de solucionar esse problema, oferecendo um amplo rol de personagens para você controlar, cada qual com a sua história, e apostando num visual que mistura o estilo artístico chibi dos mangás japoneses menos tradicionais, com a apresentação poligonal SD (super deformed) de RPGs antigos, como o Final Fantasy VII original. Entretanto, a sua jogabilidade requer uma adaptação pela qual alguns poderão, sim, torcer o nariz.

Romancing SaGa: Minstrel Song Remastered, o review

Enredo

A narrativa do remaster não altera em nada os eventos vistos no Minstrel Song original (até porque o jogo de 2005, no PlayStation 2, era ele próprio um remake de outro jogo lançado em 1992, o primeiro jogo da franquia, que nunca deixou o Japão).

Cerca de 1000 anos antes do jogo começar, três deuses demoníacos – Saruin, Schirach e a Morte – estavam em guerra com a divindade benevolente Elore. Ao passo em que Schirach e a Morte perderam seus poderes, Saruin, o mais poderoso dos três, acabou aprisionado em outra dimensão, acessível apenas por 10 pedras sagradas, chamadas “Fatestones”. Desde então, as forças da escuridão se uniram para roubar as pedras e libertar seu mestre.

Dentro do jogo, você escolhe um entre oito protagonistas: Albert, um príncipe destinado a herdar uma região nobre de Rosalia; Aisha, membro de um grupo nômade pacifista chamado “Taralians”; Jamil, um ladrão vindo do reino de Estamir; Claudia, uma feiticeira adotada por uma bruxa muito antiga; o pirata só-que-gente-fina Hawk; Sif, uma guerreira com motivos visuais nórdicos originária da convenientemente chamada Valhalland; Gray, um misterioso espadachim sempre em busca do próximo tesouro e, finalmente, Barbara, parte de um grupo de artistas circenses viajantes.

Separar o jogo em oito protagonistas é o primeiro de vários acertos de Romancing SaGa: pelo jogo ter uma característica de exploração não linear, cada um destes heróis tem o seu próprio prólogo, explicando seus motivos e anseios durante o jogo, ao mesmo tempo em que faz você se acostumar com a jogabilidade menos tradicional. Conforme você avança no jogo, as narrativas de cada um vão se amarrando, culminando no objetivo em comum de derrotar as forças a serviço de Saruin.

Se apresentando desta forma, o jogo consegue criar um enredo que se ramifica em várias partes logo no começo, e personagens aparentemente não relacionados se encontram, cada um suas histórias, e você vai entendendo como cada um chegou em um certo ponto crucial da trama por conta própria, gerando identificação.

Claro, nem tudo é perfeito: Gray parece ser o personagem mais interessante, mas acaba mal desenvolvido, ao passo em que Albert segue a história mais padronizada possível do “órfão rico que quer fazer o bem”. Ainda assim, são pequenos detalhes que você pode ignorar com facilidade – nada disso vai impactar demais a sua partida.

De uma forma simples, a Square Enix conseguiu criar uma linha narrativa consistente mesmo que muito dela seja baseada em padrões já bem “batidos” dos RPGs.

Imagem mostra cena do jogo Romancing SaGa: Minstrel Song Remastered

Imagem: Square Enix/Divulgação

Áudio

Romacing SaGa: Minstrel Song Remastered teve um grande trabalho em seu desenvolvimento sonoro, isso porque a dublagem e a trilha sonora do PlayStation 2 – composta por Kenji Ito e Nobuo Uematsu (sim, o mesmo Uematsu de Final Fantasy) tinha certas pontuações diferentes em relação às plataformas atuais. Essencialmente, os graves originais pareciam mais estourados, como se uma caixa de som estivesse com defeito no alto-falante (o nome disso é slapping, uma técnica de se tocar no contrabaixo, para os músicos de plantão)

Para o remaster, os sons foram reaproveitados, porém é possível notar vários rearranjos que amenizam os tons mais intensos o que, para mim, acabou suavizando demais momentos do jogo em que as coisas deveriam ser intensas, como algumas lutas contra chefões ou cenas de corte com narrativa emocional particularmente carregada: é meio estranho você estar em uma batalha onde o oponente pode literalmente derrubar seu grupo com uma pancada e o som ser mais…upbeat e animado.

A dublagem dos personagens também teve um pequeno reajuste: os atores originais ainda são os mesmos e nenhuma regravação de diálogo foi necessária, pelo nosso conhecimento, mas o som parece estar mais limpo e as vozes, mais audíveis, o que é um ponto positivo para um jogo que aposta fortemente no elemento narrativo e cenas de corte que contam uma história com vários arcos.

Imagem mostra cena do jogo Romancing SaGa: Minstrel Song Remastered

Imagem: Square Enix/Divulgação

Visual

Conforme mencionado acima, o jogo aposta em um visual mais caricato – o estilo chibi japonês é caracterizado por mostrar personagens mais “cabeçudos” em relação aos corpos, a fim de destacar expressões e olhares. Não que isso seja muito evidente aqui já que os modelos das pessoas do jogo são redesenhos dos sprites originais, reinseridos dentro de um ambiente 3D. Em outras palavras, as pessoas parecem adesivos colados.

Não que isso seja ruim: é incomum à primeira vista, mas logo você se acostuma e consegue observar detalhes que o dinamismo de uma animação mais tradicional certamente deixaria passar. Os personagens têm roupas espalhafatosas, cujas cores se integram bem ao cenário ao fundo, e cada cena se torna um agrado de assistir. Embora seja um jogo com história longa, você quase não sente vontade de adiantar as animações, menos ainda de cortá-las.

No que tange à ambientação, Romancing SaGa: Minstrel Song Remastered foi bastante retrabalhado, priorizando desenhos em três dimensões a fim de dar mais vazão à exploração por parte do jogador. Ao invés de uma região fixada pela progressão lateral, você tem um ambiente completo em 360º, podendo percorrer todas as direções. E como a representação artística envolveu a recriação de muitas das cidades do jogo, fãs do título de 2005 poderão sentir uma sensação de ineditismo, como se estivessem vendo pela primeira vez algo que já conhecem.

O mesmo, no entanto, não pode ser dito do mapa mundial: quando você está nas regiões selvagens, onde os monstros estão à mostra, a apresentação é bem, digamos, “básica”, como se não houvesse um esforço do design. Uma região em particular – o início da aventura com Gray – é praticamente um chão verde com um céu azul e umas manchinhas marrons aqui e ali para dar um ar bem mentiroso de diferenciação de terrenos. Não seria algo perdoável nem no PlayStation 2, que dirá no PlayStation 4 ou PlayStation 5.

Uma pena, pois todo o resto garante que você tenha um grau bastante elevado de imersão, que se perde no instante em que você bota o pé para fora de uma cidade.

Imagem mostra cena do jogo Romancing SaGa: Minstrel Song Remastered

Imagem: Square Enix/Divulgação

Jogabilidade

Aqui é onde Romancing SaGa: Minstrel Song Remastered encontra o seu divisor de águas. O jogo estabelece um panorama de “vocações” bastante similar a qualquer sistema de classes da maioria dos RPGs. Ao contrário deles, porém, você consegue trocar a base do seu personagem – tirá-lo, por exemplo, da aptidão para habilidades de ladrão para as de um cavaleiro.

Por um lado, isso oferece uma extrema liberdade de construção para o jogador, mas por outro, a falta de um direcionamento nesse volume de possibilidades faz com que você possa gastar recursos valiosos em habilidades aparentemente úteis, mas que adicionam pouco “tempero” à sua aventura.

E esses recursos são escassos: inimigos são combatidos em um sistema padrão de RPG por turnos, cedendo recompensas como dinheiro (“ouro”) e jóias. O primeiro é bem óbvio: você o usa para comprar itens e armas. O segundo é mais denso, usado exclusivamente na aquisição de habilidades especiais variadas – algumas para a batalha, outras para exploração. Mas como o volume de recompensa é várias vezes inferior ao custo dessas benesses, você pode acabar ou gastando um tempo maçante no bom e velho grind, ou assumindo várias missões opcionais para aumentar seus ganhos.

E tanto um como o outro têm problemas: Minstrel Song não tem um sistema de níveis como se vê em outros RPGs. Ao invés disso, quando você fica forte demais para uma determinada região, o jogo engrandece o poder dos inimigos sem você perceber, equiparando-os a você sem uma razão aparente, mas também sem mudar muito as recompensas.

Na prática, o jogo não oferece incentivos para que você progrida e, sabendo disso, por várias vezes me peguei fugindo das batalhas e travando aquelas em que eu apenas fosse obrigado por algum objetivo específico de missão. Ah, e algumas dessas missões são condicionais: uma decisão errada numa escolha aqui pode travar uma side quest lá na frente, ou mesmo uma decisão correta pode lhe impedir de pegar uma missão porque você demorou demais para chegar até ela, mas você não tinha como saber disso.

Em termos resumidos: conhece a expressão “pecar pelo excesso ou pela falta”? Bom, Romancing SaGa vai punir você pelos dois.

Se você puder ignorar isso – apesar do tom pesado da crítica, não é algo que lhe impeça de curtir o jogo – então vai aproveitar bastante as lutas em si, que são cheias de recursos de combate que adicionam um senso estratégico que, honestamente, os RPGs contemporâneos têm medo de adotar. Não é exatamente algo destinado a pro players de RPG, se é que isso existe, mas também não é muito casual e vai exigir que você preste bastante atenção.

A única ressalva vai para um sistema aleatório de aprendizado de técnicas de luta que aparece conforme você amplia a sua afinidade com alguma arma. No meio de uma luta, uma habilidade nova pode aparecer, ser executada para grande dano e, a partir daí, virar um comando permanente no seu rol de ataques. Por isso, o começo do jogo tem um início meio lento de combate, já que você não tem um arsenal muito desenvolvido, mas persistindo, rapidamente seu guerreiro se torna uma força a ser temida. É estranho, aleatório e totalmente fora do seu controle, mas dá para se acostumar.

Agora, fora do combate, a exploração vai exigir um pouco de… paciência. Isso porque o jogo tem muita coisa para se procurar, muitos “cantinhos” a se pesquisar, mas a câmera não ajuda. Por alguma razão, a Square Enix não implementou controles básicos de visão (o conhecido “movimentar o personagem com o analógico esquerdo, e a câmera com o direito”), então por vezes você vai se pegar fazendo uma curva e olhando para uma parede, até que a câmera se ajuste sozinha às costas dos personagens.

Desnecessário dizer, isso me colocou em problemas várias vezes, já que, dobrando uma esquina, eu não vi que se escondia ali um monstro potencialmente forte.

Imagem mostra cena do jogo Romancing SaGa: Minstrel Song Remastered

Imagem: Square Enix/Divulgação

Veredito

Acho que não há um título mais verdadeiro que o nosso para definir a experiência de Romancing SaGa: Minstrel Song Remastered. O jogo tem muita coisa bacana que vai apelar ao gosto dos jogadores mais tradicionais de RPG, ao mesmo tempo em que possui uma fluidez narrativa ao mesmo tempo grande e cativante. Para os mais novos ou os mais velhos, ele pode agradar muito.

Entretanto, todas as suas qualidades têm um aspecto negativo de contraponto – e por vezes, essas contradições tornam momentos essenciais do jogo um tanto irritantes. Eu tive que brigar com a minha própria paciência para não parar o jogo algumas vezes por causa de alguma bobagem de câmera ou a falsa sensação de recompensa, mas para mim, acabou compensando: a história me agradou bastante e a possibilidade de revisitá-la com outros personagens me apeteceu.

Mas ao final de tudo, ninguém vai poder te julgar se isso não for muito a sua “praia”.

Romancing SaGa: Minstrel Song Remastered está disponível para PlayStation 4 e 5, Windows (PC), iOS, Android e Nintendo Switch (desculpem, fãs do Xbox).

Galeria de Imagens

[Review] Assim como um diamante bruto, remaster de Romancing SaGa precisa de lapidação
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