As notícias sobre o New Bing da Microsoft mal esfriaram e o Google já tentou correr atrás do prejuízo: durante uma transmissão veiculada mais cedo hoje (8), a empresa de Mountain View ofereceu aos espectadores mais detalhes sobre o Bard, seu sistema de diálogo inteligente com base na inteligência artificial (IA) e concorrente do ChatGPT.

De uma forma geral, a apresentação liderada pelo chefe do Google Search, Prabhakar Raghavan, se mostrou promissora, com o Bard estabelecendo rotas de planejamento para uma viagem de carro ou oferecendo referências e recomendações de qual carro comprar. Entretanto, talvez ironicamente, o sistema acabou compartilhando uma fake news que passou despercebida para algumas pessoas.

A apresentação foi feita quase que inteiramente em slides, com Raghavan ressaltando que a tecnologia será eventualmente integrada ao buscador do Google, mas que, neste momento, ela está em estágios bem iniciais de testes – algo que corrobora o anúncio original da empresa, feito na última segunda-feira.

No exemplo principal, o executivo mostrou como o Bard pode ajudar você a escolher, digamos, um carro elétrico ou a combustível, listando benefícios e problemas de ambos os lados:

“Digamos que você esteja procurando um carro novo, um que seja mais apto à sua família. O Bard pode ajudar você a pensar em todos os ângulos a serem considerados, desde segurança até o orçamento e muito mais, e tirar algum sentido de tudo isso.

Por exemplo: carros elétricos têm zero emissões quando ligados, o que é melhor que um carro movido à gasolina para o meio ambiente. Carros à gasolina produzem emissões que aumentam o aquecimento global. Carros elétricos tendem a ter uma operação mais barata e não exigem troca de óleo ou revisões tão frequentes, além de terem menos partes móveis e, consequentemente, menos coisas podem dar errado.

Por outro lado, carros elétricos têm um alcance mais limitado, dependendo do tamanho da bateria. E recarregá-los pode demorar um pouco, especialmente se você usar uma estação de recarga pública.” – Prabhakar Raghavan, chefe do Google Search

A impressão que fica é que, ao contrário do concorrente ChatGPT, aliado à Microsoft, o Bard deve funcionar mais como uma oferta de conteúdo analítico, ao passo que a ferramenta da OpenAI oferece respostas mais diretas – pense assim: enquanto o ChatGPT lhe oferece um cardápio completo de churrasco, o Bard vai listar os açougues mais baratos para comprar os itens mais comuns a este tipo de evento, além de te ajudar a planejá-lo.

Entretanto, a apresentação em si não foi livre de problemas: conforme visto pelo Manual do Usuário e apontado por diversos outros veículos da mídia internacional, o Bard foi questionado sobre “como uma pessoa poderia explicar as descobertas do Telescópio Espacial James Webb (JWST) para seu filho de nove anos”.

Com muita confiança, o Bard respondeu três coisas:

  • Em 2023, o JWST avistou várias galáxias apelidadas “ervilhas”
  • O telescópio produziu imagens de galáxias que têm mais de 13 bilhões de anos
  • O JWST tirou a primeira foto da história de um planeta fora do nosso sistema solar

Essa última é onde está o problema: “planetas fora do Sistema Solar” são referidos como “exoplanetas” – mas o James Webb não fez o primeiro registro de um. Na verdade, o primeiro exoplaneta foi registrado…em 2004. E seu autor é o convenientemente chamado VLT (sigla para “Telescópio Grande Pacas” – podemos ou não ter tomado liberdades na tradução).

Especificamente, este é o primeiro exoplaneta que registramos. Ele se chama “2M1207b” e corresponde ao ponto vermelho no canto da imagem:

Imagem mostra o 2M1207b, o primeiro exoplaneta fotografado

Imagem: VLT/NASA/Reprodução

Aliás, a própria NASA – a agência espacial americana – denuncia o erro do Bard em sua página oficial. E se você quiser especificamente chato, essa é só a primeira imagem: o primeiro exoplaneta descoberto veio em 1992 e, antes dele, uma observação de 1988 só foi confirmada em 2003. E ainda antes disso, as primeiras evidências de corpos planetários fora da nossa vizinhança espacial apareceram em 1917. Hoje, temos – ao todo – 5.307 exoplanetas confirmados em 3.910 sistemas planetários, e mais de 850 deles têm dois ou mais exoplanetas. 

Ok, a esse ponto, estamos “pegando no pé”: justiça seja feita, a IA do Google não errou por muito – ela provavelmente se confundiu em alguns fatos, apenas: em setembro do ano passado, o JWST tirou a sua primeira foto de um exoplaneta (chamado “HIP 65426 b”). E dada a imensa divulgação que o telescópio vinha recebendo, todo o material que ele produziu tinha facilidade de aparecer muito na mídia.

Considerando que tanto o Bard como o ChatGPT dependem especificamente de informações publicadas na internet, é fácil ver onde se deu a confusão. Ironicamente, no entanto, é o concorrente do Google que já levantou suspeitas de baixa credibilidade.

O Google não comentou o erro até agora, mas durante a apresentação, a empresa ressaltou que o Bard é uma ferramenta em testes, e que são essas avaliações disponibilizadas a seletos grupos que vão aprimorar a ferramenta a um nível de qualidade mais apurado.

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