Para atender aos estudantes remotamente durante a pandemia de Covid-19, quase todas as escolas e universidades brasileiras buscaram serviços ‘gratuitos’ de empresas estrangeiras, como Google e Microsoft, sem o questionamento necessário sobre os termos dos acordos que assinaram, de acordo com levantamento mencionado no segundo relatório da série sobre plataformização da educação no Brasil, elaborado pelo Comitê Gestor da Internet (CGI.br).

Educação em um cenário de plataformização e de economia de dados: parcerias e assimetrias” traz um panorama para futura investigação sobre motivações de agentes públicos de adotarem plataformas comerciais e estilos de contratação, bem como os possíveis impactos aos dados dos usuários dessas plataformas adotadas em ambiente de ensino.

Google Microsoft

Imagem: Maria Thalassinou/Unsplash

Em relação a esse ponto, o relatório analisou a ameaça à proteção de dados pessoais e sensíveis, especialmente de crianças e adolescentes, como também as finalidades – além das especificamente relacionadas à educação – para as quais essas informações foram coletadas. Quanto ao processamento, transparência e se as estatísticas que podem ser produzidas a partir dos dados serão, por exemplo, compartilhadas.

“O estado de emergência imposto pela pandemia exigiu uma adoção às pressas de tecnologias digitais na educação, como forma de evitar a interrupção do ano letivo. Mas, temos de projetar como isso será daqui para frente. É preciso rever muitos desses acordos com empresas privadas, garantindo efetivamente que atendam ao interesse público”, avalia Rafael Evangelista, conselheiro do CGI.br e coordenador do grupo de trabalho responsável pela publicação.

E para o futuro, será necessário que o país construa formas seguras e escaláveis de garantir acesso a plataformas educacionais, antes que crises como a provocada pela pandemia aconteçam novamente, enfatiza Evangelista. “Esse relatório mostra que precisamos pensar no futuro. Seguiremos com esse trabalho e, em breve, lançaremos o terceiro estudo da série, que irá propor caminhos e soluções para este cenário”, adianta.

Carência de questionamento sobre os termos

O desconhecimento sobre como funcionam os modelos de negócios das grandes plataformas e a pressão provocada pela crise sanitária, serviços ofertados como ‘gratuitos’ passaram a ter ampla adoção de secretarias de educação e universidades, sem devido questionamento sobre termos que aceitaram.

“É possível inferir que não houve ponderação sobre haver alguma garantia por parte das empresas em relação à transparência sobre uso dos dados de professores e alunos, ou se o uso dessas ferramentas poderia gerar dependência para a realização das atividades escolares, bem como não consideraram quais poderiam ser os impactos nas atividades de ensino e aprendizagem”, esclarece o documento.

Desta forma, “a existência de formas de remuneração indireta e exploração econômica de dados pessoais nos softwares e aplicações de Internet para educação pública não permitem o enquadramento do conceito clássico de ‘não onerosidade’ que comumente qualificam os convênios e instrumentos congêneres”.

O relatório ainda conclui que a “inexistência do debate sobre a necessidade de regulação de plataformas especificamente para uso educacional” dificulta o monitoramento dessas ações e impede um aperfeiçoamento das soluções e uma aprendizagem compartilhada entre os governos (com planejamentos e abordagens centralizados ou compartilhados).

Dados remuneram plataformas escolares 'gratuitas' do Google e Microsoft, aponta CGI.br

Imagem: Thomas Park/Unsplash

Na França, Educação não quer plataformas ‘gratuitas’ do Google e Microsoft nas escolas

Na contramão, o ministro da Educação francês Pap NDiaye confirmou em novembro que não quer plataformas da Microsoft e Google nas escolas. De acordo com NDiaye, Microsoft Office 365 e Google Workspace “não são compatíveis com a GDPR e nem com a doutrina da ‘cloud central'”, ou seja, não atendem aos requisitos atuais.

A Commission Nationale Informatique & Libertés, agência francesa responsável pela proteção de dados, recomenda que as instituições utilizem conjuntos de colaboração oferecidos por prestadores de serviços que estejam exclusivamente sujeitos às leis europeias e “que hospedem dados dentro da UE e não os transfiram para os Estados Unidos”.

No país, a circular Dinum, publicada em 2021, afirma claramente que “a implantação do Office 365 é proibida nas administrações francesas” e que os dados não devem mais ser hospedados nos serviços em nuvem do Microsoft 365, para protegê-los de uma possível quebra de segurança ou até mesmo do uso indevido pelos serviços de inteligência dos EUA.

Além disso, a decisão do Ministério da Educação considera a decisão “Schrems II” do Tribunal de Justiça Europeu em 2020, cujo texto invalidou a estrutura transatlântica para a transferência de dados pessoais de usuários europeus para os Estados Unidos.

 

Com informações Convergência DigitalSiècle Digital

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