Se tem algo que o mundo dos negócios – em especial o da tecnologia – tem de conviver rotineiramente, esse algo atende pelo nome de “mentira“. Não tanto pela falcatrua propriamente dita, mas porque o mundo dos negócios tecnológicos envolve uma quantidade exorbitante de dinheiro e investimentos o que, fatalmente, pode atrair charlatões e até mesmo fazer com que empresas cheguem a omitir fatos para não ter de lidar com as consequências de suas ações impensadas (ou, seriam elas, estrategicamente pensadas?)

E que dia mais propício para falar sobre mentiras do que hoje, não é mesmo? Neste 1º de abril, quando é comemorado mundialmente o Dia da Mentira, o TecMasters selecionou alguns casos emblemáticos da nossa querida e questionável tecnologia – sejam escândalos, polêmicas, ou o que mais uma mentira pode englobar -, para você relembrar.

1. A revolução que virou fraude

Elizabeth Holmes foi a fundadora de uma conhecida startup do Vale do Silício: a Theranos, especializada em biotecnologia – ao menos era o que a empresa alegava. Tudo começou em 2003, quando Elizabeth fundou a própria startup com intuito de revolucionar o mercado de exames de sangue. À época, ela tinha apenas 19 anos e, em pouco tempo conquistou espaço no mercado com o sistema da empresa, chamado “Edison”: uma espécie de minilaboratório de análises clínicas responsável por processar centenas de informações de um paciente usando apenas algumas gotas de sangue. Promissor, não?

A Theranos chamou tanta atenção durante sua existência que Elizabeth chegou a ser listada no tradicional ranking das cem pessoas mais influentes do mundo pela revista Time em 2015.

A mentira: John Carreyrou, jornalista do Wall Street Journal, foi o responsável por colocar em xeque a integridade das técnicas aplicadas nos exames realizados pela Theranos, apontando imprecisões e deficiências que estavam resultando na entrega de laudos imprecisos de testes relacionados a HIV, câncer e abortos espontâneos.

Com a investigação, Elizabeth e seu então CEO da empresa, Ramesh Balwani, foram acusados de “fraude massiva” pela Comissão de Títulos e Câmbio dos Estados Unidos (SEC) e posteriormente condenados por lesar pacientes e investidores. Hoje, com 39 anos, a ex-empresária tem até o fim deste mês para se entregar e foi oficialmente condenada a 11 anos e três meses de prisão em decorrência da condenação. Já Balwani foi condenado a 12 anos e 11 meses de prisão.

Para saber mais: a investigação Carreyrou deu origem ao livro Bad Blood – Fraude Bilionária no Vale do Silício (Alta Books, 2019) e posteriormente, em 2022, virou a minissérie dramática The Dropout, disponível no Brasil pela Star+.

2. O problema dos dados

Não é incomum polêmicas dentro do mundo da tecnologia as quais englobam dados de usuários. Ou, mais precisamente, o mau uso dos dados de usuários. Isso foi o que aconteceu em 2015, com o escândalo do Facebook – também conhecido como “o escândalo Cambridge Analytica”.

A mentira: a legislação vigente afirma que se há dados de usuários a serem coletados por empresas de tecnologia, tais dados não podem ser identificáveis. Ou seja: você pode até ter autorização para coletar dados, mas eles devem ser neutros, contendo apenas informações demográficas (tais como gênero, idade, cidade e outras informações que identificam um usuário, mas não a pessoa real específica que responde por aquele determinado usuário).

Mark Zuckerberg

Imagem: Anthony Quintano from Honolulu, HI, United States (CC BY 2.0), via Wikimedia Commons

No caso da Cambridge Analytica, uma empresa especializada em análise de dados, o que aconteceu foi justamente o contrário: a companhia foi acusada de coletar informações pessoalmente identificáveis de mais de 50 milhões de usuários do Facebook desde 2014. Tais dados foram usados como base para campanhas políticas e o esquema foi desmascarado pelos jornais The New York Times e The Guardian, os quais trouxeram detalhes sobre a atuação da empresa, bem como o envolvimento do Facebook e de políticos da época – no caso, a Cambridge Analytica participou ativamente da campanha de Donald Trump nas eleições de 2016.

Para saber mais: o escândalo virou um documentário pela Netflix em 2019 chamado Privacidade Hackeada (The Great Hack, no original em inglês).

3. O festival que nunca aconteceu

Já ouviu falar do Fyre Festival? O evento tinha tudo para dar certo: grandes modelos contratadas para fazer uma campanha massiva de propaganda, que serviria de chamariz para atrair milionários para uma luxuosa festa no Caribe. A ideia era passar alguns dias em um festival luxuoso e VIP de música eletrônica, regado a bebidas e diversão. O problema é que o festival nunca aconteceu. E mais: as pessoas pagaram para ir no evento, chegaram no local, na data marcada, só para dar de cara com um espaço precário (bem diferente do anunciado), vendo com os próprios olhos que o convite simplesmente era uma fraude.

A mentira: Billy McFarland era um conhecido do mercado de tecnologia. Ele foi fundador da Magnises, startup que tinha como propósito entregar uma espécie de “clube de vantagens” para pessoas endinheiradas. O público-alvo da empresa eram millennials que costumavam se cadastrar no clube por conta da promessa de “exclusividade”. Assim, McFarland conquistou seu espaço e, mais para frente, fundou a Fyre Media, responsável pelo aplicativo Fyre – focado no mercado musical. Em 2016, o então CEO da Fyre decidiu dar uma grande festa para promover o aplicativo, o tal Fyre Festival.

O esquema foi tamanho que McFarland conseguiu apoio do rapper Ja Rule para a promoção do evento, além de contratar modelos conhecidas como Bella Hadid e Kendall Jenner. O festival, como você pode imaginar, foi um fiasco: teve sérios problemas sérios de gestão e, mesmo assim, chegou ao ápice de entregar os convidados na ilha reservada ao fatídico final de semana que, de festival luxuoso, passou a ser apenas de tendas e sanduíches pré-embalados. A Vanity Fair chegou a descrever o fraudador como “o garoto-propaganda de golpes na era millennial“.

 

McFarland e o festival receberam inúmeras reclamações e processos, se tornando alvo de investigações federais em 2017 – ano em que o evento deveria ter acontecido – as quais culminaram na condenação do então responsável pela atração. Em março de 2018, McFarland se declarou culpado por fraude eletrônica, admitiu ter usado documentos falsos para conseguir investidores (e a injeção de US$ 26 milhões para erguer sua empresa). Em outubro do mesmo ano, ele foi condenado a seis anos de prisão.

Para saber mais: o fiasco de festival virou um documentário também pela Netflix, chamado Fyre Festival – Fiasco no Caribe (The Great Hack, no original em inglês).

 

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