Ouvir o piloto de uma aeronave pedir que eletrônicos sejam colocados em “modo avião” é algo costumeiro para quem está habituado a viajar pelos ares. Seja em viagens domésticas ou internacionais, o sistema operacional dos seus smartphones, notebooks e outros portáteis deve, por regras da aviação civil, se valer de uma configuração que anula todos os sinais de um aparelho, preservando o bem estar dos sistemas de uma aeronave.

Assim como ouvir esse alerta durante as fases mais importantes de um voo, também é costumeira a dúvida de boa parte dos internautas: o que acontece se você desobedecer a ordem e deixar, digamos, seu smartphone fora do modo avião, receptivo a todo e qualquer tipo de sinal de rádio? A resposta pode surpreender, mas não da forma que você espera.

Imagem mostra um celular com o modo avião acionado

Imagem: Camilo Concha/Shutterstock

Modo avião: amigo da viagem, inimigo do usuário?

Antes de mais nada, vamos estabelecer o que é o modo avião: essencialmente, trata-se de um posicionamento sistêmico de dispositivos eletrônicos, no qual o aparelho em questão fica totalmente impedido de receber qualquer sinal ou tentativa de conexão de rádio. Em termos práticos: nada de wi-fi ou sinal de dados autônomos (4G, 5G).

Dentro do modo avião, seu smartphone ou notebook é automaticamente impedido de estabelecer qualquer conexão. Isso, no entanto, não é algo definitivo e, mesmo com esse formato ligado, você ainda pode acionar manualmente sistemas de conexão que julgar necessários – wi-fi e bluetooth podem ser utilizados normalmente, mas o sinal de celular não.

E qual a “birra” disso com os aviões de transporte? Bem, segundo vários reguladores de aviação – a ANAC no Brasil, a FAA nos EUA e assim por diante – manter o smartphone receptivo a sinais pode atrapalhar os sistemas de rádio da aeronave, impedindo-a de executar suas obrigações eletrônicas corretamente.

O mantra que toda empresa de viagem aérea repete incessantemente é bem conhecido justamente por isso: a pretexto de preservar a aeronave, os aviadores ordenam o seu isolamento eletrônico – convenhamos, não há muito para quem você ligar ou mandar aquela mensagem “no ‘zap’” a 10 mil metros de altura.

Mas o que pode acontecer se o modo avião ficar desligado?

Vamos tirar isso do caminho agora: não, você não vai derrubar o avião se deixar os receptores ligados no seu celular. Providência divina, falha mecânica ou Samuel L. Jackson atirando em serpentes podem tirar uma aeronave do céu, mas o seu celular não. Ok? Ok.

Entrando no “tecniquês” da coisa, sinais emitidos e captados por aparelhos de uso pessoal são bastante similares – em alguns casos, exatamente iguais – a aqueles usados por aeronaves em sistemas de comunicação e navegação. Esse “encontro” acaba gerando o que especialistas chamam de “interferência eletromagnética”.

Em 1992, no entanto, um estudo independente encomendado pela Boeing e sancionado pela Força Aérea estadunidense concluiu, por meio de testes, que aparelhos eletrônicos de pequeno porte não interferem na condução da aeronave salvo pelas suas “fases críticas” – em outras palavras: decolagens e pousos, além de imprevistos ao meio do vôo, como tempestades. Desde essa época, então, o uso de aparelhos passou a ser permitido fora desses momentos específicos. E mais além, a tecnologia atual já evoluiu o suficiente para criar faixas de frequência diferentes entre dispositivos pessoais e sistemas de aeronave.

Então por que, mesmo com tudo mais seguro do que há 10, 20, 30 anos, as empresas aéreas e reguladores de aviação civil ainda insistem nessa ordem (sim, é uma ordem em muitos países, com penalizações previstas legalmente)?

Bom, apesar da faixa do celular ser diferente daquela da aeronave, ainda há um outro problema: sinais de conexão são distribuídos por antenas no solo, que emitem os pedidos de conexão a serem convertidos e interpretados pelo seu dispositivo. E essas antenas ainda podem causar interferências eletromagnéticas ao direcionar pedidos de conexão para os seus itens.

A situação tornou-se ainda mais preocupante em anos recentes com o advento do 5G – mais desejável devido à sua maior largura de banda e mais velocidade.

Agora, imagine o cenário: um 747 da Boeing tipicamente segura algo entre 450 e 470 passageiros por viagem. Todos esses passageiros estão no céu, tentando conectar-se ao 5G, avolumando requisições de recepção de sinal e, de repente, o que é uma demanda de um aparelho, torna-se algo bem maior e mais evidente – talvez mais evidente que o sistema da aeronave possa suportar.

Isso é suficiente para oferecer risco à viagem? Provavelmente não. Convenhamos, sistemas de contenção geralmente são construídos com altíssima robustez, contando com problemas de volumes sobrehumanos justamente para essa finalidade. Mas ainda assim, você quer mesmo ser aquele cara que vai desafiar a autoridade justamente do pessoal que vai te salvar no caso de ocorrer algum problema?

O que diz a lei sobre o modo avião?

Nada, na verdade, haja vista que não há um consenso técnico estabelecido sobre o assunto. E a normativa pelas reguladoras de aviação civil estipulam regras próprias para isso. Aqui no Brasil, as autoridades afirmam a necessidade do modo avião nos momentos críticos listados acima, mas há países na Europa, por exemplo, que vão além, e ordenam o desligamento total de qualquer eletrônico presente por toda a viagem.

Por essa razão, algumas linhas aéreas oferecem wi-fi a bordo, em uma frequência isolada daquela usada no resto da aeronave (spoiler: caro pacas, e extremamente lento). Com esse benefício – se você puder pagar por ele – você consegue deixar o aparelho em modo avião e acionar a busca wi-fi manualmente, valendo-se de uma conexão sancionada pela equipe de voo.

E lembre-se: mesmo que não exista uma particularidade legal que lhe obrigue a acionar o modo avião durante o voo, você ainda está sujeito às regras da equipe de linhas aéreas (comissários, piloto e co-piloto etc.) para o assunto. A empresa tem liberdade para pedir que você acione o modo ou, em alguns casos, desligue o aparelho, incidindo penalizações caso você se recuse a fazê-lo.

Há também que se considerar a dispersão de foco do ser humano: se você está com a cara grudada no celular, então provavelmente não prestará atenção às orientações dos comissários e comissárias de bordo – e, hoje, já sabemos como saber seguir essas dicas é meio que uma coisa importante

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