A Autoridade de Concorrência e Mercados (CMA) do Reino Unido tem sondado acordos de compartilhamento de receita de busca – e hipoteticamente de navegadores rivais – em sistemas iOS pagos pelo Google à Apple. De acordo com o regulador antitruste, os pagamentos substanciais poderiam desencorajar concorrência entre as gigantes da tecnologia.

Embora Apple, Samsung e outros fabricantes recebam bilhões de dólares para fazer do Google Search o mecanismo de busca padrão em seus dispositivos, bem como de navegadores da Mozilla, a CMA ainda não havia relatado uma investigação sobre o Chrome no iOS e o respectivo acordo de compartilhamento de receita de busca que o Google tem com a fabricante de Cupertino.

Compartilhamento de receita paga pelo Google à Apple entra no radar de regulador

Kumamoto, Japan – May 7 2020 :
Close up of Apple & Google brand logos on green iPhone screen in dark mood.

Um dos argumentos da autoridade incidem sobre pagamentos substanciais – tanto para buscador quanto navegador –, o que poderia desincentivar a concorrência. Como resultado de pressão regulatória, isso parece estar mudando: além de aumentar a equipe do WebKit do Safari nos últimos dois anos, a Apple emitiu recentemente uma atualização do WebKit para a primeira versão beta da versão 16.4 do navegador da Maçã.

Em um relatório final de estudo de mercado público sobre ecossistema móvel da CMA, a agência descreve timidamente vários acordos de compartilhamento de receita supostamente competitivos entre as duas citadas.

Alguns trechos que foram redigidos, omitem detalhes cruciais do que pode ser o segundo produto pelo qual a Apple está sendo paga. “O Google paga à Apple uma parte da receita obtida com o tráfego de busca no iOS nos seguintes contextos: em troca de ser o fornecedor padrão de busca no Safari, o Google paga à Apple uma parte da receita derivada do tráfego de busca no Safari; e de acordo com vários acordos comerciais, o Google paga à Apple uma parte da receita derivada do tráfego de busca [x].”

A palavra retirada pode ser outro produto possível  Apple, como a Siri, ou mesmo do Google, como o navegador “Chrome”. “Sob estes acordos, a Apple recebe uma parte significativa da receita do tráfego do Google Search no Safari e [x] nos dispositivos iOS. Os pagamentos estimados do Google à Apple pelo status padrão de busca no Safari (£[1-1,5] bilhões no total em 2021 para o Reino Unido) foram substancialmente mais do que aqueles feitos a seu próximo maior parceiro, a Samsung. Este alto nível de pagamento provavelmente refletirá as fortes posições da Apple em navegadores (e outros pontos de acesso de busca) e motores de busca (através da restrição do WebKit).”

No entanto, outro trecho do relatório, que trata mais especificamente da receita de tráfego do navegador no iOS, pode apontar para o Chrome, já que neste contexto seria o único a se enquadrar. “Dada esta parcela de receita, quando [x] ou Safari têm sucesso em competir por um usuário iOS, em vez de ganhar uma parcela completa da receita do tráfego de busca, ele ganha apenas uma parcela (ou seja, a receita à qual não tinha direito anteriormente). Estes acordos de compartilhamento de receita, portanto, diminuem os incentivos para a concorrência entre navegadores no iOS.”

Embora a resposta não seja evidente, já que a Apple não fornece nenhum valor óbvio aos usuários que procuram usar o Google Search no Chrome, uma ação antitruste arrastada para agosto do ano passado pode oferecer uma explicação.

Em 29 de março de 2022, o escritório de advocacia Alioto em São Francisco entrou com uma ação, alegando que a Apple foi paga pelos lucros que teria obtido se tivesse competido com o Google, sem o custo e o desafio de fazê-lo. “Como mais da metade dos negócios de busca do Google foi realizada através de dispositivos Apple, a Apple era uma grande ameaça potencial para o Google, e essa ameaça foi designada pelo Google como ‘Código Vermelho'”, sustenta a queixa. “O Google pagou bilhões de dólares à Apple e concordou em compartilhar seus lucros com a Apple para eliminar a ameaça e o medo da Apple como concorrente”.

O compartilhamento de receitas foi notado anteriormente, em 20 de outubro de 2020, quando o Departamento de Justiça dos EUA e mais 11 estados americanos apresentaram uma queixa antitruste contra o Google.

Antitruste: Apple, Google e a ilegalidade de divisão de mercado

Ao The Register, o advogado Joseph M. Alioto disse que não o surpreenderia saber que o Google tem pago à Apple pela receita da busca derivada do Chrome. “O acordo que começou com US$ 1 bilhão por ano, chegou a atingir US$ 15 bilhões anualmente em 2021”, disse Alioto. “A divisão do mercado é por si só ilegal sob as leis antitruste”.

“A Apple teria muito pouco incentivo para assumir o Google em qualquer dos mercados de busca e, portanto, manteria o duopólio em busca em ambas as plataformas”, explicou Donald Polden, diretor Emeritus e professor de direito da Universidade Santa Clara da Califórnia, ao concordar com a afirmação da CMA de que os acordos “amortecem os incentivos para a concorrência entre navegadores no iOS”.

“Há alguns anos, alguns de meus alunos de antitruste estavam me perguntando por que a Apple não construiu sua plataforma de busca móvel Safari para assumir a busca no Google e esta é uma explicação muito boa – é muito benéfica para manter o domínio um do outro”.

Polden disse ainda que as conclusões da CMA podem influenciar ações antitruste do outro lado do Atlântico contra ambas as empresas, embora tais casos possam focar em outros aspectos de conduta anticompetitiva nos mercados de busca e publicidade.

Nos Estados Unidos, o Google enfrenta processos do Departamento de Justiça por ações anticoncorrenciais, a qual também prepara um possível caso antitruste contra a Apple.

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