Quando Cyberpunk 2077 saiu, podemos dizer que seu lançamento foi… problemático: o jogo estava lotado de bugs em praticamente todas as plataformas que o receberam, e a polonesa CD Projekt Red fez o que pôde para dissuadir a insatisfação do público para um game que, antes, vinha com tanto hype que teve até Keanu Reeves “tirando o ar” alheio no palco da E3 2019.

Quase dois anos depois da chegada do jogo (e muitos, muitos patches de correção e conteúdo), a CD Projekt Red se aliou à Netflix para produzir o anime Cyberpunk: Mercenários, uma série animada que, de uma ponta à outra, vem sendo sucesso de crítica, ao ponto de ser uma das produções originais mais bem avaliadas pelo público da gigante do streaming.

Com 10 episódios, um dos efeitos imediatos da série foi… reacender o interesse público no jogo. Em números impressionantes. Em vários motivos, o anime reviveu um jogo fadado a ser lembrado pelos seus problemas.

Segundo o SteamChartz, Cyberpunk 2077 tinha 13.407 jogadores até 16 de agosto. Em 6 de setembro, quando o jogo recebeu uma atualização que introduziu elementos do anime, esse número começou a crescer até que, na data de estreia da série (13 de setembro), chegou à marca de 36,2 mil jogadores. Na data em que fechamos este artigo, este número estava ainda maior: 37.715 usuários.

A interação chegou a tais níveis que o combalido jogo chegou a bater o recorde de outro título da mesma produtora: Witcher 3: Wild Hunt.

Muito disso se dá pelo fato de que, apesar do anime ser inspirado no game, o público sentiu uma familiaridade maior com os sons e visuais da produção da Netflix, efetivamente usando ela para, depois, conhecer a obra nos consoles e PC. Neste tempo entre os lançamentos das duas obras, muitos dos problemas vistos no início de Cyberpunk 2077 foram consertados. O jogo, hoje, é bom de se jogar.

Na prática, a ordem dos fatores se inverteu, favorecendo Cyberpunk 2077.

Montagem coloca lado a lado os personagens David Martinez (Cyberpunk Mercenários) e V (Cyberpunk 2077)

David (esq.) e V (dir.) são protagonistas da mesma franquia, mas enquanto o segundo vem de um jogo amplamente criticado, o primeiro lidera a história de um anime que vai acabar salvando esse mesmo jogo (Imagem: Netflix/CD Projekt Red/Divulgação)

Mas jogadores antigos também vivem um influxo de retorno ao título após assistir o anime. Isso porque, ainda que o estilo visual seja relativamente diferente – o anime tem aspectos mais estilizados e aquarelados, enquanto o jogo preza o fotorrealismo – há aquela sensação de que um determinado lugar no desenho já foi visto antes no jogo, o que confere familiaridade e reconhecimento. até os apartamentos onde moram David (protagonista de Mercenários) e V (protagonista de 2077) são bem parecidos.

Mas não é só de referências compartilhadas que vive esse renascimento do jogo: Cyberpunk Mercenários trata com naturalidade a solução de lacunas deixadas por Cyberpunk 2077. O jogo não entra muito no mérito de como, por exemplo, o sistema de saúde de Night City prioriza os ricos, deixando os pobres ao relento. É apenas uma situação que, dado o contexto do jogo, sempre foi assim. Um pano de fundo para algumas questões do jogo, mas nada muito explorado mais a fundo.

Em Mercenários, essa questão não é a principal, mas é um pilar de sustentação que dirige muito da narrativa: o cuidado com pacientes após o falecimento, a obtenção de remédios que inibem a rejeição aos implantes cibernéticos nos corpos dos personagens, os efeitos psicológicos que o uso em excesso desses implantes causa na mente humana – tudo isso é chave para a progressão da história do anime, efetivamente complementando partes que, no jogo, ficaram faltando.

Outro ponto forte é a disparidade entre os dois personagens principais: enquanto V embarca em uma jornada em busca de um objetivo magnânimo – a cura para um problema sério que vem infectando a sua mente – David é apenas um moleque mal saído da adolescência que, por uma série de eventos, se vê sem dinheiro e sem projeto de vida em uma cidade onde tudo tem uma taxa.

Independente das razões de cada um, ambos acabam trabalhando como mercenários, realizando trabalhos de alto risco e alta recompensa para vários clientes. Essa dicotomia de como dois pontos divergentes de vida levaram a mais ou menos à mesma solução é uma inflexão que faz com que fãs do jogo se apeguem ao anime, e vice-versa.

Colagem mostra duas cenas violentas em Cyberpunk Mercenários e Cyberpunk 2077

Apesar do jogo e do anime terem suas próprias direções de arte, ambas as obras conversam visualmente – especialmente na violência (Imagem: Netflix/CD Projekt Red/Divulgação)

A boa notícia é que, em meio a muitos conteúdos cosméticos e vários patches de correção, Cyberpunk 2077 ainda tem uma mega expansão planejada que promete uma nova ambientação, várias missões e uma linha narrativa própria que, ainda que atrelada ao jogo principal, consiga progredir sozinha se necessário.

Tudo isso justifica um retorno ao jogo para, no mínimo, você buscar nele referências que viu no anime. E se o prospecto de novos conteúdos não lhe é suficiente para atrair a sua atenção, de repente vale você abrir uma exceção para esse caso.

Ao final de tudo, a CD Projekt Red pode conseguir seu objetivo de tornar Cyberpunk 2077 um sucesso, afinal. Seria uma redenção bem merecida.

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